Publicado em 25 de março de 2022
A Lei Geral de Proteção de Dados trouxe consigo diversos avanços e, ao mesmo tempo, diversas dúvidas sobre como será, na pratica, a aplicação da lei. Aqui no Blog, você pode acompanhar diversas questões que já elencamos e respondemos no âmbito civil em relação a LGPD, mas, nenhum deles respondeu como se dará a aplicação da norma no âmbito penal.
E ainda, não sabemos.
Corre no legislativo, um anteprojeto, conhecido como “LGPD PENAL” que vai tratar da relação entre proteção de dados x segurança pública e persecução penal.
Mas no fim, como isso pode influenciar na vida dos operadores do direito e do Ministério Público?
Entenda, a LGPD, trata de assegurar direitos fundamentais de privacidade e segurança aos brasileiros. Via de regra, não podem mais as empresas, públicas ou privadas, armazenar e tratar seus dados sem que você tenha conhecimento e consentimento, possibilitando assim, maior controle das suas informações, por você mesmo. Entretanto, a tecnologia é uma atualidade e, cada vez mais, vem auxiliando no combate ao crime.
Não precisa ser muito esperto para perceber que há um vácuo legislativo onde não se sabe, por exemplo, o atual limite permitido de uso dos dados por agentes públicos na investigação criminal.
No bom português; até quando os policiais, ou o Ministério Público, poderão usar os dados para a investigação?
Na grande São Paulo, existe um sistema muito complexo de câmeras que são inteligentes: conseguem identificar veículos e pessoas, o caminho que fizeram e assim, a probabilidade de pra onde foram. E isso é ótimo para o combate ao crime. Mas, com o avanço das penalidades da LGPD, já existem multas aplicadas a empresas que mantinham câmeras com capturas faciais de pessoas físicas.
Com isso, gera-se uma insegurança jurídica, onde a falta da legislação especifica, e sem jurisprudência (por se tratar de matéria nova), não se sabe como procederão os juízes nas sentenças, onde entenderão que houve abuso do uso de dados? Onde não houve? Não há parâmetros.
Desse ponto, nasceu o anteprojeto da LGPD Penal, para regular o uso dos dados pelas autoridades policiais.
Só que: desde o início, já apresentou forte objeção do Ministério Público pois, usando o capítulo 7º do projeto, que trata da segurança da informação, determina que só poderão ser utilizadas as tecnologias de monitoramento mediante autorização judicial.
O que isso significa?
Seguindo essa ideia, o processo de investigação se torna menos efetivo e mais moroso. Um carro que fugiu em alta velocidade, precisaria de uma autorização de um juiz para que se utilize as câmeras da cidade para tentar localiza-lo. Do outro lado, o advogado desse mesmo infrator, conseguiria algum tipo de alivio, caso haja abuso no tratamento de dados contra seu cliente?
Usando o mesmo pensamento, só que de outra visão, foi noticia no Brasil todo que um ator de Hollywood estava cometendo crimes por aqui. Michael B. Jordan, de filmes como Pantera Negra, Creed e Sem Remorso, consta no catalogo da Policia Civil do Ceara, como suspeito de participar da chacina da Sapiranga.
Nesse caso, não precisamos nos preocupar com o Sr. Jordan, ele sequer estava no Brasil na data dos eventos, e tem muitas possibilidades de se defender de uma acusação falsa/enganosa. Mas e se fosse o Sr. João, vizinho de algum parente seu? Se algum sistema de reconhecimento facial entende-lo como suspeito, dependendo da situação, até explicar que focinho de porco não é tomada…
Uma acusação enganosa poderia colocar em risco a liberdade do Sr. João, bem como sua integridade física dependendo da situação. Discriminação por erro gerando consequências irreparáveis.
A lacuna na norma que a LGPD trouxe é a culpada por todos esses questionamentos. Diante de um cenário de necessidade urgente do poder público, se não for bem elaborada para atender a esfera penal, poderão haver travas que impeçam, por exemplo, a ação policial, acarretando em severas consequências. Já no caso de discriminação e mau tratamento dos dados, poderá levar o Sr. João à prisão, o que não é novidade no Brasil.
Observa-se, portanto, a célere necessidade de que o anteprojeto seja oficialmente apresentado por um senador, para de fato se tornar um Projeto Lei. Entretanto, também é fundamental que a Lei seja minuciosa para que de fato, proteja a sociedade brasileira e traga novamente segurança jurídica ao país.
Escrito por:
Hubert Limborço – Estagiário
Jean Carlos Borges – Sócio/Coordenador do Departamento Consultivo OAB/MG 147.402